mardi 5 novembre 2013

O Equador e o petróleo


1 O Equador é um estado latino-americano, voltado para o Pacífico, a que pertencem as célebres ilhas Galápagos. Tem quatro vezes a extensão de Portugal mas é talvez dos países mais pequenos da América Latina.
A capital, Quito, fica num dos pontos mais altos do país e é uma cidade de extrema beleza, que visitei duas ou três vezes.
O seu presidente Rafael Correa é um político progressista, que tem dado à população mais pobre do Equador um grande impulso. É respeitado e popular. Mas o Equador é dotado de petróleo, o que tem sido, de certo modo, uma desgraça para o país.
Isso faz-me lembrar o tempo do salazarismo, em que um ministro, muito alegre, veio dar ao ditador a notícia de que havia petróleo em Angola. E Salazar levou as mãos à cabeça e comentou: "Que outra desgraça havia de nos acontecer..."
Vem isto a propósito de que no Equador houve uma petrolífera americana de
 nome Chevron/Texaco, que entre 1964 e 1992 desenvolveu as suas atividades
 nas províncias de Sucumbios e de Orellana, na região amazónica, uma das zonas 
com maior biodiversidade do planeta.
A Texaco, ao que me dizem, derramou cerca de 71 milhões de resíduos de 
petróleo e 64 milhões de petróleo em bruto em mais de dois milhões de hectares 
na Amazónia equatoriana, tal como determinou um tribunal equatoriano, depois 
de nove anos de processo judicial.
Este desastre ambiental - e é de um desastre ambiental que se trata - foi 85 vezes maior do que o derrame da British-Petroleum no golfo do México e 18 vezes maior do que o do Exxon Valdez no Alasca.
Trata-se de uma catástrofe que podia ser evitada facilmente se a petrolífera não tivesse sido irresponsável e não tivesse utilizado - para gastar menos - técnicas obsoletas. A Chevron/Texaco, ao que parece, violou o contrato de exploração que se comprometia a utilizar tecnologias de reinjecção segura dos resíduos tóxicos no subsolo. Para quê? Para maximizar os seus enormes benefícios económicos, utilizando no Equador uma tecnologia que já não era utilizada nos Estados Unidos e que a empresa, tendo prometido diminuir o impacto negativo das operações hidrocarboríferas, não fez. Se assim tivesse acontecido tinha evitado a contaminação no Equador.
Mas a Chevron/Texaco fugiu às suas prometidas obrigações ambientais e foi condenada a pagar uma indemnização de 9,6 mil milhões de dólares e não cumpriu. Além disso, escondeu muitas piscinas de resíduos tóxicos, cobrindo--as com capas superficiais e deixando-as no mesmo estado contaminado, o que tem sido um mal para o povo equatoriano. A empresa petrolífera processou o Estado equatoriano, quando este nunca teve nada que ver com o assunto.
A verdade é que a União das Nações Sul-americanas expressou a sua solidariedade com o povo e o Estado do Equador, vítimas de campanhas desprestigiantes.
O petróleo é sem dúvida nenhuma de grande importância, mas quando só se 
veem os negócios e o dinheiro e se desprezam as pessoas e os Estados, tudo 
vai mal. E os Estados Unidos ficaram desclassificados. Pobre Barack Obama que, 
numa causa destas, não tem qualquer culpa no cartório. Mas tudo lhe cai em 
cima.
VIDAS COM SENTIDO
Permitam-me que vos fale da Fundação que represento e que chame a vossa atenção para a série de conferências intitulada "Vidas com Sentido", relativas a todos os dirigentes do Partido Socialista já falecidos.
Foram pessoas de grande qualidade humana, política e ética, que nunca se apropriaram de dinheiros públicos, apesar de terem exercido altos cargos. Estadistas que gastaram o seu próprio dinheiro com o partido e foram sempre impolutos. Todos tiveram a preocupação de que ser estadista nada tem que ver com negócios. Antes pelo contrário. Os homens de negócios não devem ser estadistas, porque isso implica uma contradição nos termos...
Essas sessões de homenagem são feitas às quintas-feiras às 18h00, tendo começado por Francisco Ramos da Costa, economista, diplomata e grande militante antifascista; Raul Rêgo, jornalista, Pena de Ouro, que lhe foi atribuída na Europa pelo caso do jornal República, que ele dirigia e onde ficou sequestrado com os outros jornalistas no chamado "Caso República"; o nosso presidente querido Fernando Valle, que dirigiu com António Arnaut o Congresso, onde a Acção Socialista se transformou em Partido Socialista; e, ultimamente, Manuel Mendes que infelizmente morreu antes do 25 de Abril e não chegou a ser do PS mas apenas da Acção Socialista, e que se bateu na guerra civil de Espanha, ao lado dos republicanos, assaltou a esquadra onde é hoje a Faculdade de Economia e Finanças de Lisboa, para libertar da prisão o diretor da Fazenda Pública que teve a audácia de fazer entrar os primeiros tanques militares que houve em Portugal, para uma revolução antissalazarista, como muitas outras infelizmente frustrada. Foi um verdadeiro seareiro (da revista Seara Nova) e um autor consagrado de romances, contos, biografias e também de escultura e artes plásticas. Hoje, está quase esquecido.
O próximo, na quinta-feira, dia 7, será o advogado e ex-ministro da Justiça e das
Finanças (como Afonso Costa, lembrei-lhe eu muitas vezes), Salgado Zenha,
apresentado pelo Presidente Jorge Sampaio.
Estas homenagens a personalidades já falecidas e que tudo fizeram pela Pátria, pela República e pelo socialismo democrático, sem receber nada em troca, sublinho, vão-se prolongar para o próximo ano. Falamos de verdadeiros estadistas ética e humanamente impolutos e que, quanto a mim, merecem ser uma referência para as novas gerações.
A verdade é que nos últimos dois anos e meio a política confunde-se, cada vez mais, com os negócios e por isso é fácil, a quem não tenha conhecimento de causa, julgar que todos os políticos são uns trafulhas ou simples negociantes.
Numa época de crise em que tanta gente é obrigada a emigrar de Portugal e nem sequer tem dinheiro para dar de comer aos filhos, pode generalizar-se a ideia de que os políticos são todos uns gatunos. Ora não são. Há políticos que são (e foram) homens de Estado e um exemplo do que deve ser um político que ama a sua Pátria e o povo a que pertence.
JOHN KENNEDY
Faz cinquenta anos que foi assassinado John Kennedy, um político americano,democrático, ilustre Presidente eleito dos Estados Unidos, queentusiasmou o mundo e mesmo personalidades difíceis como De Gaulle, queorecebeu em Paris com extremo respeito e admiração e muitos outros stadistas e ferentes países.Fui, sem o conhecer, um grande admirador de John Kennedy, que sempre me pareceu um exemplo de democrata, de homem progressista e com grandes valores éticos.
Lembro-me bem do momento em que a notícia do seu assassinato chegou. Era então um jovem advogado e foi uma jornalista americana, do New York Times, correspondente em Portugal, Marvine Howe, que me informou. Fiquei verdadeiramente sem saber o que dizer e fazer. Foi algo que me impressionou e marcou imenso, para a vida inteira. Sobretudo porque depois da morte de John Kennedy foi também assassinado o seu irmão e conselheiro fiel, Robert Kennedy, candidato a Presidente, como o seu irmão.
Como é possível que um homem na flor da idade, católico praticante (o que era raro nesse tempo nos Estados Unidos), e de uma família daquela qualidade, ter sido morto e logo a seguir os assassinos terem repetido a dose matando o seu irmão, igualmente uma pessoa de enorme gabarito?
Pareceu-me qualquer coisa como se a América tivesse desaparecido, bem como a democracia e o progresso, pelos quais eu, na minha modéstia, também lutava.
Passaram cinquenta anos e a imprensa mundial, que eu saiba, pouco tem falado
 dos Kennedy. Houve mais assassinatos, embora diferentes, como o de Martin
 Luther King, herói contra o racismo e pela unidade de todos os americanos e por
 isso Prémio Nobel da Paz.
É possível que as mortes dos Kennedy, tivessem que ver com a crise dos mísseis de Cuba e o princípio da Guerra Fria, com a construção do Muro de Berlim (que anos depois visitei e me fez uma imensa impressão) e o conflito aceso entre soviéticos e americanos. Estava então a começar a guerra do Vietname...
Kennedy, assassinado a 22 de Novembro de 1963, foi um extraordinário Presidente dos Estados Unidos da América, como hoje é unanimemente reconhecido, mesmo por alguns republicanos.
PORTAS QUER SER E NÃO SER AO MESMO TEMPO
O texto longo e confuso que Portas leu na sexta--feira passada e que não faz qualquer sentido, como escreveu Vasco Pulido Valente, é realmente, como disse Pacheco Pereira, "um manual para ler no vazio". Porque, cito, "este papel de Portas não foi tomado a sério por ninguém a começar pelos seus colegas do Governo"...
Vi e ouvi, com bastante esforço, o discurso que proferiu, muito bem vestidinho,
 como sempre e com grandes sorrisos, mas confesso que apesar de me esforçar 
por estar atento, quase não compreendi coisa nenhuma. Era de facto, um guião  
ou melhor, uma salganhada - sem qualquer sentido.
Tinha de apresentar o guião porque o prometera fazer há longos meses. Mas aproveitou para dizer tudo ao contrário do que desejaria o seu patrono Passos Coelho, que quando fala no sócio não lhe é nada favorável.
Realmente são duas pessoas que não se entendem, mas que se esforçam por estar juntos para não terem de se demitir ambas. Aliás, quem lhes vale é quem os comanda, ou seja, o eterno protetor de ambos: o Presidente da República. Se não fosse essa proteção - que ninguém entende - como é que conseguiriam conviver juntas?
Recentemente, um grande fadista português, seguramente o maior e mais respeitado de todos, Carlos do Carmo, teve a coragem de dizer o que pensa do Presidente da República, e não usou palavras brandas como toda a gente notou e ouviu.
Por mais que façamos, tudo tem que ver com a mesma pessoa. Chama-se Aníbal Cavaco Silva. Como é que um Presidente, a quem ainda faltam dois anos para o fim do seu mandato, não é capaz de se libertar de um Governo, completamente paralisado, sem rei nem roque, e principalmente de duas pessoas que não se entendem entre si e só existem juntas porque ele as mantém? Tem razão Carlos do Carmo.
O Presidente não quer - ou não pode por razões que se ignoram - perceber que
 se ficar até ao fim e assim continuar, ficará para todo o tempo com o ferrete do
 ódio popular, de norte a sul do País.
O discurso de Portas - Guião para a Reforma do Estado - é com efeito algo de irresponsável e que ninguém consciente pode tomar a sério. Com discursos como este está a destruir o seu próprio partido - e o pouco que resta do seu prestígio. A tentar ao mesmo tempo que se volte de novo à austeridade (o que ele não quis no passado), quando a troika e o próprio Governo de Passos Coelho assim o querem. Mas Portas disse já isso e o seu contrário. O partido dele está cada vez mais a definhar e o próprio líder todos os dias mais desqualificado... Para quê? Pela vaidade insuportável de Portas ou por medo de que lhe atirem à cara, como o caso dos submarinos, que até agora não foi esclarecido. Portas, não tem nada que fazer. Quem manda é a ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, de quem Portas não gosta nada. Como de Passos Coelho. Mas a tragédia é que não se podem separar, porque perdiam a maioria, e os lugares.
O mais estranho é que os outros ministros também fiquem calados, sem protesto, sem qualquer comentário, porque também não têm coragem de se demitir apesar de saberem que se o não fazem ficam igualmente com um ferrete, que nunca mais desaparecerá.
In DN, por MÁRIO SOARES